PERCIVAL MARICATO
Sócio de Maricato Advogados, é diretor da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel)
A Reforma Tributária aprovada na Câmara dos Deputados premia alguns setores econômicos e promete castigar outros com mais impostos. Entre os produtos que terão sua produção e comercialização penalizadas e encarecidas está o de bebidas alcoólicas, qualificado com “externalidades negativas”. Por causa disso, sofrerá incidência do “imposto seletivo”.
Mesmo antes de tais conceitos, as bebidas já eram alvo de aumentos de impostos. De acordo com dados do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação), o percentual de imposto pago sobre um copo com chope é de 62,2%; cerveja, 55,6% o preço de cada garrafa. Adeptos da cachaça pagam mais: 81,87% por garrafa; amantes do vinho não saem ilesos: 54,73%; e destilados importados, como uísque, chega a 61,22%. Para deixar ainda mais claro: ao se beber uma simples caipirinha, o consumidor paga 76,66% de impostos. Portanto, que fique claro: no Brasil, há muito tempo, “bebe-se” mais impostos do que a própria bebida. A elevada carga tributária inviabiliza o desenvolvimento de exportações significativas na área. No sentido contrário, muitos países, inclusive da tão admirada Europa e nos Estados Unidos, os investimentos nesse segmentos são crescentes porque a taxação não é tão abusiva.
Ao contrário do que muitos acreditam, novos aumentos de impostos sobre essa classe de bebidas, principalmente se inadequados, terão resultados negativos. As alíquotas elevadas atuais já estimulam o crescimento dos alambiques de fundo de quintal, as bebidas e selos falsificados, o contrabando, a informalidade, a concorrência desleal e a sonegação. Ao aumento da criminalidade some-se o risco à saúde pública. As descobertas de adulteração e falsificação de bebidas alcoólicas têm crescido, acompanhadas do aumento de registros de consumidores adentrando hospitais por causa de seus efeitos.
No setor de bebidas, mais impostos equivalerão a uma lei seca para pobres. Mesmo um chopinho ficará caro para a renda da maioria dos brasileiros. Será um imenso prejuízo para milhões de pequenos produtores, distribuidores, proprietários e funcionários de bares e restaurantes. Só destes últimos dependem pelo menos 7% da população brasileira.
Para milhões de brasileiros, tomar um chope, uma taça de vinho ou mesmo uma cachaça conversando socialmente com amigos, namorando ou falando dos prazeres e desprazeres da vida significa algo: liberdade. E, no contexto atual, grupos de interesse em levar a sociedade para a forma que entendem ser a correta têm atuado para tolher direitos individuais e coletivos. Sem coragem de expor claramente a qual agenda servem, optam pela distorção dos fatos para impor a ditadura do moralismo, agora na atividade econômica.
O tamanho da incidência do imposto seletivo ainda será definido nos próximos meses, mas é importante que esses milhões e milhões de brasileiros que produzem, comercializam, gostam e querem tomar seu drinque no final de tarde ou à noite fiquem alertas. Ou o resultado será uma lei seca mostrenga, castigo para todo um setor econômico constituído principalmente de pequenas empresas.
Folha de São Paulo
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